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Liberdade, para todos!



Há 70 anos, em 14 de maio de 1948, sob os auspícios das Nações Unidas, David Ben-Gurion anunciou ao mundo a fundação do Estado de Israel. Findava ali o longo ciclo das diásporas ju-daicas que tiveram início em 722 a.C., quando os assírios conquistaram Israel, e foram consoli-dadas em 70 d.C. quando os romanos destruíram Jerusalém. Expulsos de suas terras, os judeus se espalham pelo mundo, sempre procurando manter sua identidade étnica e sua religião.

A refundação de Israel é um símbolo de liberdade para o povo judeu. Responsável por trazê-los de volta à Palestina, a terra prometida por Deus à Abraão, ela ocorreu no rastro do Holocausto, quando aproximadamente seis milhões de judeus foram exterminados nos campos de concen-tração nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. Por isso, há muito a ser comemorado pela comunidade judaica mundial. Israel hoje é uma nação próspera, científica e tecnologicamente avançada, que acolhe seus filhos de onde quer que provenham.

Mas há também muitos problemas a serem solvidos em Israel. O principal deles é a questão palestina, alimentada pela demora em se criar um Estado palestino, pela presença dos assenta-mentos judeus na Cisjordânia e pelo bloqueio marítimo de Israel à Faixa de Gaza. A questão palestina também é nutrida pela exclusão relativa dos palestinos e outras minorias étnico-reli-giosas que vivem em Israel, aos quais são negados os direitos e liberdades desfrutados em geral pelos judeus. Formando aproximadamente 20% da população de Israel, eles possuem restrições em seus direitos civis e políticos, ocupam os piores postos de trabalho, ganham menores salários e vivem predominantemente nas zonas periféricas.

Fruto da luta contra a dominação, infelizmente, o Estado de Israel não confere real igualdade de direitos e oportunidades para os judeus e as demais minorias que há séculos vivem no que hoje é o seu território. Cabe ao Estado de Israel, que se autodefine judeu e democrático, aprofundar a difusão dos direitos civis, políticos e sociais para todos os israelenses, para que esse jovem Estado não seja judeu para como os palestinos e democrático somente para com os judeus.

Maio também é um mês de celebração da liberdade para muitos brasileiros. No dia 13 de maio de 1888, a princesa Isabel assinou a Lei Áurea e pôs fim há mais de 300 anos de escravidão. A presença dos negros no Brasil não foi fruto de políticas migratórias. Ela também resultou de uma diáspora, a diáspora negra, pela qual milhões de homens e mulheres foram tragados pelo regime escravocrata que as potências coloniais europeias implantaram nas Américas. O Brasil, lusófono, recebeu aproximadamente 5 milhões de escravos até 1888. Nenhuma outra nação moderna inseriu tantos escravizados em sua sociedade.

Por séculos as populações negras que foram arrastadas para o Brasil coexistiram com diferentes formas de violência. Angolas, benguelas, minas e outros tantos foram animalizados nos navios negreiros, mortificados pela escravidão, brutalizados pelos castigos físicos e desconfigurados em suas identidades étnicas, sociais e familiares. Homens e mulheres foram transformados em me-ras mercadorias, em força de trabalho viva, desumanizada, cuja existência deveria cumprir o único propósito de gerar proveito, inclusive sexual, para seus senhores.

A assinatura da Lei Áurea foi fruto de inúmeras lutas. O movimento abolicionista foi a primeira causa sociopolítica a mobilizar os brasileiros, sendo certo, também, que para a abolição concor-reram fortemente atores internacionais, em particular a Inglaterra, cujos interesses no mercado brasileiro eram muito acentuados. Após a abolição, contudo, não houve qualquer política para integrar as populações negras à lógica do mercado assalariado. Como ensinou Florestan Fernan-des, em seu clássico A integração do negro na sociedade de classes, o regime escravocrata foi extinto sem que o Estado, os antigos senhores ou mesmo a Igreja assumissem quaisquer res-ponsabilidades para com os negros e negras libertos. Nenhuma política compensatória, ne-nhuma atenção, nenhum direito ou garantia lhes foi destinado. A liberdade negra no Brasil não foi mais do que o abandono dos indesejáveis.

A abolição da escravatura não foi um projeto do Estado imperial brasileiro, mas, antes, uma consequência da inserção do país nas estruturas do capitalismo internacional. A partir de 1840, o Brasil foi sendo gradualmente alocado na lógica de suprimento de matérias primas para as potências industriais europeias. Esta inserção foi sedimentada a partir dos anos 1870, quando o fim da Guerra do Paraguai (1864-1870) ampliou o fluxo das exportações agrícolas, permitiu o ingresso de milhares de imigrantes e facilitou a expansão dos investimentos domésticos e inter-nacionais na (infra)estrutura produtiva do país.

A partir de então, o movimento abolicionista, até então limitado às diferentes expressões da resistência negra, bem como aos setores ilustrados das camadas médias urbanas, começou a conquistar novos adeptos. Primeiro, aderiram os latifundiários alheios à cultura cafeeira cujos escravos foram drenados pela produção de café. Em seguida aderiram aqueles vinculados aos setores mais dinâmicos da burguesia nacional, que, ligados à indústria, ao comércio, as casas bancárias ou às ferrovias, em nada se beneficiavam do escravismo. Por fim, os cafeicultores mais abastados, já abastecidos por imigrantes europeus e inseridos na modernidade capitalista, não viam mais razão em manter o escravismo.

Tal como firmado por Caio Prado Jr., em História econômica do Brasil, as populações escraviza-das restaram obsoletas, pois o capital fixo empatado ao longo da vida produtiva do escravo, acrescido dos seus custos de manutenção e dos riscos de fuga, doenças e outros imprevistos tornaram-se incompatíveis com as novas dinâmicas do capital. O trabalhador assalariado, então desprovido de direitos sociolaborais, oferecia riscos menores e fácil substituição.

A imigração fez das populações outrora escravizadas homens e mulheres descartáveis, relega-dos ao trabalho doméstico e ao subemprego. Fez deles parte de um exército industrial de re-serva, sem educação formal, sem direitos e sem esperança. Se o imigrantismo foi a compensa-ção estatal para os “prejuízos” causados às elites agrário-exportadoras pela abolição, aos negros e negras libertos não restou outra coisa senão o preconceito e o peso da miséria e da exclusão. Por isso, o 13 de maio não pode ser celebrado sem um forte juízo crítico.

No que tange às populações negras brasileiras, portanto, coloca-se um desafio semelhante àquele vivido por Israel em face dos palestinos e demais minorias étnico-religiosas: a promoção da igualdade de oportunidades e de direitos. Israel não realizará plenamente as promessas de Deus à Abraão enquanto não acolher como seus os filhos de Hagar. O mesmo vale para o Brasil. Os (cada vez mais aviltados) direitos e oportunidades devem vir igualmente para todos: negros, indígenas, asiáticos, brancos e mestiços. Que haja verdadeira liberdade, para todos!

Lier Pires Ferreira, professor do Ibmec/RJ e do CP2




 







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